Meu sangue circula nesta cidade de concreto bruto de espessuras monumentais,
de sangue frio como de cobra, de obras como o Masp feio pra caramba, sem expressividade nenhuma por fora, mas que por
dentro mexe com a cabeça de muitas
pessoas que passam pelo crivo de sua arquitetura medíocre; das muitas e
conhecidas avenidas badaladas, do edifício Itália que se sobressai em altura
dos demais e que na minha infância, uma
simples entrada ali seria a concretização de um sonho. As
entranhas do velho centro não são bonitas, aliás, são medonhas, um contraste do
belo e do horrendo. Sou genuíno de
nascimento, concebido na brigadeiro Luiz Antonio, isso diz muito, porque
destrincho o centro como poucos... As bibocas, as nobres, as conhecidas ruas.
Não tenho saudade destes lugares que dei muitas pernadas. Curioso que sinto saudade de lugares que pouco fui, meio que de passagem e talvez por isto criaram esta ânsia pelo desconhecido, pela cidade que foi meu berço. Lugares que desejo conhecer pelo dito nas
revistas... O Antro de sabores, da média e alta sociedade, lugares badalados
cheios de glamour, comidas excêntricas de nomes estranhos, sabores lidos, mas
nunca desfrutados e uma nostalgia do que poderia ser... Do que poderia ser vivido e conhecido com a pessoa amada, dos
bistrôs e restaurantes, bares restaurantes com seus cardápios extravagantes,
caros e apetecíveis. Acho que meu coração está entrelaçando desejos carnais a
sonhos hollywoodianos, sim, a fantasia vendida em prateleiras cheia de variedades quiméricas, o
encantamento do sucesso estribado em ambientes lúdicos, freqüentado por pessoas
bem sucedidas com chefs criando sabores provocantes e que aguçam a sensação de
precisar provar. De se ver ali naquela euforia de pedidos feitos constantemente,
burburinhos e conversas paralelas inaudíves; confusas. A beleza explodindo em
rostos saudáveis. Só não sei ao certo de onde vem esta vontade nostálgica de um
lugar que nunca conheci, conhecer no sentido de se debruçar num balcão e pedir uma cerveja, um
chope ou quem sabe uma mistura exótica criada ali naquele momento, afinal ali
parece que tudo se pode, tudo combina... Um dos motivos talvez seja estar num ambiente que seria o marco entre o que fui e o que sou. Aquela
sensação de superação em que você diz: agora eu posso e... Mereço... Algo
para consolidar uma identidade alcançada
mas nunca vivida, o despojo, o banho para se livrar do resto do passado que
precisa insistente de um marco libertador. Ou quem sabe esta
inserção seja pela necessidade de estar onde se sonha o amor. Largo do Batata,
tão destacado por aqueles que alimentam sonhos, e estômagos... Ou quem sabe o
encontro do menino com o homem como se num passe de mágica se abrisse o portal para o
encontro do presente e do passado e ali se
olhassem como dois estranhos que têm a
certeza de se conhecerem porém ainda estranhos pelo que sonharam. Aquele menino
estranhando o que se tornou e o homem desdenhando do que ele foi. Quem sabe um
debate, uma afronta, um abraço conciliador e enfim a despedida, certos que
desfrutam do mesmo DNA, e inquestionavelmente
são a mesma pessoa, mas que por alguma razão prodigiosa do caminho
vivido, dois estranhos.
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