Um final de dia comum, véspera de
feriado. Eu precisava cortar o cabelo. Como
saíra tarde do serviço precisava acelerar pra chegar ao salão a tempo de ainda pegá-lo aberto.Não deu. Estava resolvido que cortaria o cabelo
naquele dia, não estava afim de perder a viagem. Lembrei-me de outro
salão, um pouco a frente de onde eu estava e rapidamente me dirigi a ele. E, mesmo
sem conhecer resolvi que cortaria ali, isso se o salão ainda estivesse aberto. Sorte estava. Havia 3 pessoas fora aqueles que cortavam. Uma senhora e um
casal de crianças, o que conclui que logo seria atendido. Realmente não estava
disposto a voltar pra casa sem cortar o cabelo. Perguntei se ainda poderia
cortar. O cabeleireiro mais velho que julguei ser o mais indicado logo
respondeu apontando para o mais novo que
este, ainda teria horário... Estava um
silencio gostoso, na televisão uma cena
da novela parecia prender atenção. A mulher, com suas duas crianças, pedia
silêncio para que ela pudesse entender o que acontecia. Seu filho, todavia,
parecia não estar muito interessado naquilo e inquieto saltitava entre uma
cadeira e outra, até que entre um comercial e outro, a mulher entretida,
resolvera com firmeza aquietá-lo, o que realmente agradeci.
O rapaz que fora indicado para
cortar meu cabelo parecia eficaz, deduzi isso observando o corte do cliente a minha frente. Na outra poltrona o cabeleireiro mais velho e que pude notar ser o mais requisitado se dividia entre os várias ligações de
clientes ansiosos a procura de vaga para cortarem seus cabelos ( talvez no
mesmo afã que o meu), recusava as
propostas alegando ainda ter muitos para atender e que não poderia atender mais
ninguém aquele dia.
Enfim chegou minha vez.
Sentei ajeitando-me como de
praxe, como se faz quando se senta numa cadeira de cabeleireiro. O jovem
cabeleireiro não parecia no melhor dos seus dias, foi denunciado pelo funga,
funga irritante que me fez de imediato pensar se tinha feito uma boa escolha
ter persistido em cortar o cabelo ali. Pensei:
o que estou fazendo aqui. Veio-me numa reprise alarmante que poderia
pegar um resfriado gratuitamente porque de alguma forma o irresponsável do
guri, resolvera trabalhar naquele estado.
Relutei para não sair dali, mas como o que estava em voga era o
cabelo, desisti de uma fuga patética
daquela situação nauseante. Pode parecer
frescura, mas pensei nos mais de 200 agentes virais oportunistas que só
estavam esperando um respingo para se refestelarem no meu corpo que aparentemente
parecia mais íntegro do que o do pobre rapaz funga, funga. Sem contar
no influenza que ganhara status de vírus
da gripe comum para assassino. Confesso
estava totalmente desconfortável ao
imaginar que ao sair dali pudesse não só
estar mais leve por conta dos cabelos deixados, mas com um vírus afamado por
conta das vítimas recentes. Numa de suas
repetitivas fungadas e tosses irritantes uma das gotículas viscosas
pareceu descer além do esperado o que
estremeci visivelmente. Minha reação obrigou o temido jovem cabeleireiro
resfriado ir ao banheiro para se recompor. Assim que voltou do banheiro avançou para um
rolo de papel que estava acomodado familiarmente na bancada onde ficavam outros apetrechos
profissionais do manente. Neste instante, o outro, o mais velho que fazia o
papel secundário de atendente de telefone, começou reclamar: Você
usou um rolo inteiro de papel, que isto?
Está pensando que dinheiro cai do céu... O rapaz tentou retrucar
alegando seu estado. O que não abalou o falastrão, reclamão e constrangedor
patrão. O homem desancou a fazer um discurso sobre os 48 rolos de papel
higiênico que comprara no mês e que fora insuficiente. E que morreria de
trabalhar só para comprar papel higiênico. E que isso seria impossível já que seus clientes sovinas viviam reclamando
do preço do corte de cabelo.
Continuou: Deveriam ter nascido mulheres para deixarem o salário todo no salão
com a pretensão de que assim veriam que
o que ele cobrava era irrisório. Aproveitando sua insatisfação com o gasto
exorbitante pelo outro que trabalhava
doente, estendeu-se a falar da burrice das pessoas que se empenhavam em ganhar
dinheiro fácil com o tal do Telex free, demonstrando sua descrença e
ressaltando a ingenuidade das pessoas que perdiam seu tempo e dinheiro num
investimento que segundo ele, se fosse
bom, não seria dividido. O homem não parou mais de falar. Cheguei a conclusão
que os dezessete reais que ele cobrava
eram realmente irrisório. E que em outra circunstância pagaria o dobro só pra não
ouvi-lo falar. Saí de lá com a sensação que nunca mais volto
e tenho a impressão que o rapaz , se pudesse, faria o mesmo.
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